quarta-feira, 30 de setembro de 2009

sonhos

Me é permitido. Então, presenteio-me com uma rosa. Arranco as pétalas de mau-me-quer. Restam poucas, as mais lindas. Se soubesses como divago o dia inteiro. Não sei ao certo do que recordo. Acordo instantaneamente. O instantâneo dissolve. De súbito, as folhas caíram sem permissão. Na mão, restou-me o caule vazio. Dois espinhos e um tapete agora branco. Adeus aos que se foram para seus lugares ou permanecem onde estavam. Permito-me abraçar a tua beleza, enquanto o chá esfria na xícara e o mate amarga. Teus versos se plantam em meu jardim. As flores hão de sorrir enquanto eu ainda estiver aqui, vivendo e semeando os meus sonhos.

conversa fiada

Vi que estava calado demais. Pedi: solta o verbo, criado-mundo! Silencioso, teimoso, persistiu quieto noite adentro. Eu, aqui, na minha cama e ele ao meu lado. Não me disse, sequer, boa noite ou durma bem.

estrelas de chuva no parabrisa

De dentro do carro, eu vi estrelas alternando a cor. Verde, vermelho, amarelo, branco. A chuva, com a sua intensidade, ora calma ora bruta, formava os pequeninos asteróides de água que iam de encontro ao parabrisa. Era a dança do universo. Se espalhava por todo o perímetro do vidro. Explosões multicoloridas. Cada partícula se despedaçava rapidamente e enchia de beleza o interior do veículo. Vi o céu bem de perto. Toda a negrura. O vaivém do limpador empurrava todo o líquido cósmico para o asfalto. A poça furta-cor de óleo parece o mistério do caleidoscópio. Um dos brinquedos favoritos na minha infância. Era água com derivados de petróleo. Descobri. É o fim daquele mistério. Visitei o céu muitas vezes por um orifício. Tinha meu céu todo para mim. As estrelas psicodélicas e nuvens com vértices arquitetônicos. Agora, a barreira criada pela fase adulta pode me impedir de desfrutar as belezas relembradas nesse vidro beijado por estrelas criadas por minha imaginação. Estrelas feitas de água que sobe e desce. Eu vi. E continuo a ver.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

portas

Ainda bem que há boca. Há conteúdo para se expressar e deixar a brancura de lado. Um linear se quebra e quem está do outro lado usa a máscara teatral do sorriso. Sorriso moldado em cerâmica. Não somos retangulares. A verdade assombra os fracos de mente. Fracos temem perder o que pensam possuir. É uma estratégia errada de defesa. Atacar sem analisar quem ou o que é alvo, e o principal: por quê? Pra que a humanidade deve avançar nesse ritmo? Continuemos assim. Todos nós. Caminhemos para um ostracismo, de casa em casa. Nos lares. Todas as portas e portões, janelas trancadas. Ninguém te abraça numa tarde de domingo. Abrem a porta e você permanece do lado de fora. Afastando o medo que trouxe. Na entrada me despeço de uma pessoa compenetrada numa TV. Era a sua diversão durante o trabalho. Não me recusou simpatia e atenção. Foi breve. Fui breve. Um mendigo fuma e manca. Passei por ele na ida e na volta por uma rua arborizada. Linda. Olhei nos olhos dele as duas vezes. Na primeira, tossiu. Na segunda, tragou. Sentou na calçada. Estava com as portas da casa abertas e se fechou para um mundo de portas fechadas. Trancafiou-se onde não há cadeados. Observa de fora os carros passando. Ninguém, ou quase ninguém, o nota. Pode incomodar por pedir um cigarro. Até então, passa despercebido. Não abre sua casa. Qualquer um pode chegar e tomar um café, cerveja. Sentar ao sofá e ver o tempo passar. Outros passam motorizando a vida, por qualquer lado. Atiram sorrisos com expressão séria. Um me atingiu de raspão. Lábios não se movem. Não sei se há conteúdo. Bocas caladas. Estou inquieto comigo por conta disso.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

macambuzio

A melancolia o toma por inteiro. Qualquer abrigo do mundo não serviria de refúgio. Dentro d'alma não há calor. Sente-se muito estranho. Hoje é quase impossível sorrir ou caminhar de cabeça erguida. No decorrer da tarde, o ato só acontece como uma tarefa mecânica ou caridosa. Nada de espontâneo ou alegre. Nada de instigante ou sedutor. Anda por aí, pisando num chão escorregadio e sem graça. Tenta não pensar em nada. Um cigarro aceso é lançado à sua frente por um homem de barbas brancas. A chama o leva ainda mais à tristeza que o persegue. Ela é sua inimiga. Sente uma sensação de letargia. Hoje é o primeiro dia que a sente dessa forma, intensiva. Chegam o medo e a tremedeira. Acha que, por ventura, pode se tornar crônica. "Ah, mas não vai mesmo", diz para si bem baixinho. Inspira profundo. Enche os pulmões. Falta entusiasmo. Ele decide ver o mar. A imensidão do oceano irá lhe trazer boas sensações. Agora, vibra por dentro. No caminho, recebe um panfleto. Lê rapidamente: compro ouro e jóias. Acelera os passos. Alguns metros adiante, tentam lhe vender balas de goma e drops. Recusa com um gesto. Vai atravessar uma avenida, mas os carros passam depressa. Demora para notar o boneco vermelho estático do outro lado da calçada. O boneco fica verde. Atravessa. Quer sentir o cheiro do mar. Num outro semáforo, o boneco está parado. Ele não veste vermelho, mas também para. Olha para o lado e percebe um cego. Segura o braço dele. Ambos andam devagar pela faixa de pedestres. Sem saber por que, lembra da mãe lhe dando conselhos de como a vida é difícil. Lembra de metáforas de sábios orientais sobre a existência humana e as artes para o alcance da felicidade. Os sábios devem ter razão. Desiste da água salgada. Compra uma Coca-Cola enlatada. Paga três reais e cinquenta centavos e acha um absurdo. Mal termina de tomar o refrigerante e um mendigo pede a lata. Ele entrega. O cara agradece. Carrega um saco preto cheio de outras latas. Ainda restam trinta e cinco minutos, de um total de 60, reservados à sua digna hora de almoço. Decide, então, almoçar. Para numa lanchonete asseada e pede suco de laranja, café puro e torta de palmito. A garçonete diz que só tem de frango. Então, pede pizza broto de mussarela. A combinação da cafeína e queijo o deixa feliz. Sorri sozinho. Bebe dois goles do suco. Paga. Os dois reais e quinze centavos de troco, pede em balas Frumello. Pronto. Está satisfeito. Sai da lanchonete para mais quatro horas de trabalho. Satisfeito com as pequenas coisas da vida. Por um bom tempo, não vai mais se sentir macambuzio.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Ana e o amor palíndromo

Ana ama Ana
Ana e Ana
Ana é Ana

Amigas em silêncio

As duas estão lá, fechadas dentro do quarto. Abafadas pelo silêncio. Silêncio inquieto que chega durante a noite. Em meio aos livros, DVDs de filmes e CDs, Clarice aguarda a amiga para prosear. Mostrar uma visão diferente do mundo. Fugir um pouco dele. Pressupostos. A conversa é feita pelo olhar. Assim tentam se entender. Discutem. Concordam bastante. Discordam pouquissimas vezes. Sempre atenta a tudo o que é dito, em silêncio, Loyola pensa em si mesma por meio da outra. É levada para o interior, ao inexplorado, até chegar ao novo. Provoca o estado tranquilo. Clarice ri para ela. Ri dela. Riem juntas. Chegam ao senso-comum. Comum? Mas não há equilíbrio. Em cada linha de prosa taciturna, há muito a dizer e entender. O cansaço tenta interrompê-las. Um livro é fechado. Os olhos não. O mundo é descoberto. Universo. Loyola deseja desvendar o que há nas falas da amiga. Coisas em comum. Fora do comum. Parecidas. O silêncio a questiona. São muitas perguntas. E não faltam respostas. Sobram. O silêncio está com ela. Não ao lado. Quer tira-la de um pensamento e leva-la a outros. Ciclo constante. Olhos pesados e secos. O barulho chega sorrateiro. Uma xícara com café frio cai e molha Clarice. Ela não se chateia. Gosta da mancha em sua pele branca. Faz o tipo dela. A janela é aberta. Uma brisa acaricia os cabelos soltos. Fumam cigarros para romper o silêncio. Há apenas o barulho do tabaco queimando e o riso interno de Loyola que se espalha rua afora, por toda avenida. Um cão late. Insônia. São quatro e meia da manhã. Loyola tatuou seu nome com tinta azul de esferográfica em Clarice. Deu um abraço e a descansou na cômoda. Breve apreço. Segue sozinho o silêncio até o nascer do Sol, quando as duas despertam mudas de mais uma noite de falação silenciosa.

expressas palavras

penso que esqueci
ou estou prestes a esquecer
apresso os passos
procuro o lápis e a pequena caderneta
não estão nos bolsos
guardo no pensamento
recordarei para escrever aqui
este instante
marcado com expressas palavras

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

em um minuto

Cambaleio dentro de mim. Sinto as pernas fracas. Elas mal conseguem sustentar o peso do meu corpo. Sento numa cadeira preta para descansar. Penso. Os pensamentos desordenados e a vontade das coisas voltarem para a sua ordem. Paz. Meu corpo quer relaxar. A cabeça dói. Sensação de enjoo. Imagino uma escadaria de mármore branco. Uma luz forte rebatendo. Pontos luminosos. Não há corrimão para subir. Apenas para descer. Existe essa ordem? Costumo subir pelo centro. Uma mãe empurra o carrinho do bebê em direção ao elevador. O futuro demora para caminhar com as próprias pernas. As minhas já estão fortes novamente. Foi apenas uma síncope. Um minuto de agonia parace eterno.

sábado, 19 de setembro de 2009

afobação

Esse ar quente e úmido, sufocante,adentra pelas narinas. Segue até os meus pulmões. Seca as vias respiratórias. Sigo caminhando lentamente. Os carros arrastam a sujeira encostada na guia e uma cortina preta me cobre. Tusso. Ou tento tussir. Tenho sede. Não tenho água. Tomo minha condução. Por alguns segundos, as pessoas me olham. Procuram algo em mim. O que posso oferecer a elas? Sorrio largamente. Não sei se me retribuem. Sento. Abro meu livro. "O homem não foi feito para a derrota. Um homem pode ser destruído, mas não derrotado", escreveu Ernest Hemingway. Sim, ele escreveu. Está em "O Velho e o Mar". Também tenho minha ligação com o mar. O cheiro e a película da maresia me acalmam. Concentram-me em mim. Me transportam para outra dimensão; um mundo diferente. Um lugar onde existem apenas as pessoas e as "coisas" que amo. Coisa é uma palavra feia. Parece designar algo feio. O mar, agora, está a poucos quilômetros. Mas, distante. Hoje, estarei mais próximo das rochas verticais. Frias. Lugares bastante habitados e cada vez mais sem vida. Aglomerado de almas se misturando sem "bom dia" e nomes. Apenas números. O vizinho do 42. Parecem produtos fabricados em série, codificados. Código de barras. 9788528607598. Salto do ônibus e, para minha surpresa, o céu ainda está claro.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

17h45

Fernando tinha um problema sério com horários. Vivia atrasado e não conseguia controlar o seu tempo. Desde a época da escola. Desde quando marcava encontros na adolescência com os camaradas e as garotas. Tentou de tudo para reverter isso. Despertadores analógicos, de corda, com som estridente. Digitais, daqueles que podem ser programados para tocar dezenas de vezes e com variados tons e músicas. Bips. Celulares de todos os tipos, com viva-voz. Certa vez, depois de perder a hora do casamento do irmão, o desespero foi seu companheiro e lhe sugeriu uma excelente ideia: contratar uma secretária. "Por que não pensei nisso antes?". Ele explicou a história a uma amiga. O trabalho era fácil: ter apenas uma cópia da agenda de Fernando. Ela aceitou, movida mais pela comoção em saber dos apuros do amigo e querer ajuda-lo, o "emprego". Mas, de nada adiantou. Nada adiantava. Mariana era muito eficiente. Detalhava tudo ao "patrão". Endereços, nomes, e o principal: o horário. Mari, como Fernando a chamava, ligava duas horas antes e passava as informações. As repetia uma hora depois. Relembrava-o faltando meia hora. Não tinha jeito. Fernando era completamente absorto. Avoado. Devia ser alguma doença. Será uma doença desconhecida? De repente, início de Alzheimer. Depois de conversar com Mari, a dispensou do serviço e agradeceu. Sem saber mais o que fazer, olhou para o céu e gritou suplicando: o tempo deve parar. O tempo deve parar! De repente, as nuvens começaram a se mover rapidamente. Escureceram. Trovões. Raios. Uma chuva intensa. Fernando pensou que aquilo era um sinal ao seu pedido. Pensou que o tempo realmente congelaria. Olhou para o relógio e, para sua surpresa, os ponteiros continuavam a se movimentar em segundos, minutos. 17h45. Acordou atrasado. Estava atrasado. Aos sessenta e cinco anos, Fernando continuava atrasado. Na segunda-feira, dia de seu aniversário, ele disse: "o tempo deve parar" .

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

felicidade

O segredo da felicidade está guardado no sorriso verdadeiro de qualquer criança.

Sem sono

Desejo dormir, mas meus olhos não cerram. Permanecem por muito tempo abertos. Bem mais do que eu queria. Pensei o suficiente como foi o meu dia. Filtrei as coisas boas e as ruins. Balanceei o aprendizado e descartei o imprestável. Já conheço todos os detalhes noturnos de meu quarto. E, por incrível que pareça, ainda me assusto com a sombra do mancebo. O cachorro, aparece caminhado como quem acabara de acordar. Mostra que está ali, depois volta para seu canto. A mente sabe as melhores horas para conseguir te controlar. Ao tentar dormir, é um desses momentos. Mente filha da mãe. Preciso descansar e ela quer que eu converse. Há de se entender. Quando nos mantemos ocupados, não temos tempo para ela. E isso pode ser chato. E é. Tenta dormir com um milhão de pensamentos ordenados, desordenados, coisas palpáveis ou não. Desejos. Metas. Medos. Anseios. Creio que todos sabem muito bem o que é isso. O melhor mesmo é desencanar do sono. Ou melhor, deitar-se quando a batalha entre sono e mente está sendo vencida por aquele. Acho que vou levantar e tomar um cálice de vinho ou uma xícara café. Não, não. Dizem que café "tira" o sono. Mas bebê-lo quando não se tem sono, é bom. Bom mesmo seria conseguir dormir. Descansar. Não dá para ler de madrugada. Assistir a bons filmes é possível, mas não quero. Não agora. Já sei! Vou fingir que não estou a fim de descansar e a mente vai me deixar dormir. Usarei de psicologia inversa e verei se dá certo. Por essa noite, não quero mais observar o meu mundo aqui do quarto.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Acaso

Próximo à costa nortesde de um arquipélago desconhecido formado por três ilhas, Alice folheava um mapa da cidade de São Paulo. Desejava encontrar a direção da Avenida Paulista, onde marcara um encontro numa cafeteria. Não iria ajudá-la, mas era a possível salvação para a estudante de Física Quântica. Assim pensava. Sem sucesso, pois estava com fome. Não comera desde quando saiu de casa para o compromisso. Na porta de sua residência, um veículo parado tinha a seguinte frase: "Para o lugar mais distante em apenas vinte minutos. Tabelado: 20 reais". Entrou, sentou. Pagou. O carro saiu rápido. Não deu tempo de passar o endereço ao taxista. Chegou às ilhas. Desceu. Não sabia o que fazer. Pegou o telefone celular e ligou para a empresa de transportes náuticos. Pediu um "táxi" com urgência. Perguntou quanto era a corrida para São Paulo. Obteve a resposta: "Depende, moça. Eu preciso saber a sua localização". Nesse instante, Alice percebeu que estava perdida.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

questões

O mundo parecia meio nebuloso nesta manhã. Acordei com dor de cabeça e sentia uma leve impressão de não saber o que fazer. Então, fiquei deitado por mais tempo que o habitual. Estou de folga do trabalho. A vida, hoje, deveria ter algum sentido diferente. Essa impressão. Não sei ao certo. Tentei entender o que estava acontecendo. A incerteza sobre o que é a vida permanece viva como a nossa pele, por exemplo. Aos poucos, vai perdendo a elasticidade mas permanece ali; cumprindo o seu papel. Se alguém com mais de noventa anos me disser que viver não vale a pena, sentirei uma breve desilusão por essa pessoa. Não quero chegar assim, perdido ou frustrado. Quero chegar bem. Estar lá, no futuro, com muitas dúvidas e questões sem respostas. Nem toda a certeza do mundo acoberta as incertezas. Nem toda garantia é garantia de dar certo. Agora, isso me vem quando os olhos daquela menina estão próximos. Seus olhos escondem a carga de um amor que a machucou. Que ainda machuca. Uma ferida que faz perder o gosto do sorvete. Dor incessante. Não quero isso para ela. Não merece a desilusão. A cobrança. A culpa que não a pertence. Todo ser humano nasceu para brilhar, disse Veloso. Ela também vai brilhar. Para mim, brilha intensamente. Traço paralelos. Trago para mim. Receio fracassar como filho, marido, irmão e amigo. Fracasssar como ser humano. Mas sigo em frente. Mesmo quando as manhãs nascerem como hoje. Lutar pelo que quero. Pensar nas pessoas boas que conheço. Humanos importantes para o bem-estar da natureza humana. E tentar mostrar para eles que todos temos nossos tempos ou dias cinzentos. O colorido existe. A vida está aí, no dia-a-dia.

à minha mulher

Não há beleza como a tua, Camille. Não há encontro mais marcante que o da tua face com lábios, olhos, cílios e nariz. Não há pele, cheiro, sabor, cor, que contraste aos teus traços de mulher perfeita-imperfeita. Explicíta e implícita. O sorriso de Camille é eterno. Assim é o meu amor por ela. Infinito entre os dias. Soma incalculável. Arte incompreensível. Natureza viva. Vida pulsante. Poesia completa. Prosa interminável. Obrigado, esposa, por ser a minha parcela feminina mais completa. Ser o próximo no sentido denotativo desta palavra. Obrigado por distanciar de mim toda a feiura que o homem criou no mundo. Obrigado por espantar os meus medos e ser o pedestal que não me deixa abaixar a cabeça. Muito obrigado por permitir andar ao teu lado, de mãos dadas. O mundo gira de maneira diferente, mas tu és minha bússola para uma direção segura. Contigo, eu não defino tempo-espaço e posso aprender o que é o agora.

importância

folha molhada
dispensa a gota d'água
que alcança o chão
molha a terra encharcada
apenas mais uma gota
não faz brotar feijão

ao meu amigo

sentimentos vivos
em amizade
te provoco com bobagens
e você ri

a beleza está em ti
gravada em teus pés
em sandálias de couro sobre o asfalto
entre os transeuntes cegos
parados no sinal verde
desejando, apenas, chegar ao outro lado

mundo e imundo precisam abrir a mente
enxergar o que há
conhecer
amar

sinto verdade
quando beija a minha face
e me abraça

seu verbo é ação
imperativo
sempre transitivo
na vida de seus amigos

domingo, 13 de setembro de 2009

ação do vento

o vento leva e traz
dançam as folhas das palmeiras
do canteiro central
da avenida principal

observo da janela do ônibus
devagar pela mesma avenida

me leva e traz

faz frio de algum lado
há causa e efeito
mas não sou a palmeira
conduzida pelo vento

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

pausa na padaria

Procuro algo mais nesse pão-na-chapa acompanhando a xícara com café forte. Algo parece perdido na imensidão dessa pequena refeição. Pausa na padaria para alegrar o meu dia. Apoio os cotovelos no balcão de mármore. Oito sabores da Nestlé. Mais sabor em minha vida. Alguém escuta a Voz do Brasil? Migalhas no prato. O tempo foi consumido em menos de dez minutos. Acerto a minha conta. Não esqueci de comprar os cigarros. Apenas não fumo. Lá fora, uma garoa fina. Aproveito as marquises. Passos lentos não aceleram a volta para casa. Vou dormir sem as respostas para as perguntas desse dia. Tudo recomeça amanhã.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

bênção artificial

Nuvens carregadas despejam água para lavar o meu rosto. Limpar a atmosfera. Tirar a sujeira das ruas. Não entendo o recado. O guarda-chuva permanece aberto. Me protejo no abrigo do ponto de ônibus. Não quero me molhar. Não dessa forma, vestido. Chego em casa. Entro no box. Debaixo do chuveiro, fecho os olhos e sinto a chuva artificial banhar-me da cabeça aos pés. Recebi a bênção morna. Estou renovado. Nada como uma ducha depois de um dia atribulado. Nada como negar o natural e controlar a sua vida.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Eu o vi. Sentado no chão, sujo, esquecido e mal vestido. Mastigando um pão velho ou algo parecido. Velho e pão velho. Íntimos. Próximos. Mendiguei mais de mim. Mendiguei meu lado humano. Foi preciso o choque. Estivera morto. Ergui a cabeça. Ele levantou-se. Seguiu cambaleando paradoxo à linha contínua, traçada por mim para fugir do que não desejava ter visto.